domingo, 8 de novembro de 2020

Desenvolvimento rural sustentável e solidário em Bacabal



            O aumento da preocupação com a questão ambiental levou à realização de várias conferências internacionais para discutir a relação entre meio ambiente e desenvolvimento. Nessas reuniões foram produzidos vários documentos, como a Carta da Terra, com propostas voltadas ao planejamento e implementação de estratégias de desenvolvimento. Porém, não se trata de desenvolvimento a qualquer custo, mas de alternativas socialmente justas e ambientalmente viáveis. Eis o “desenvolvimento sustentável”.
Diante de tamanha crise ambiental, é fundamental nos atermos, efetivamente, a esse paradigma. O desenvolvimento sustentável precisa ser traduzido em políticas públicas que articulem as dimensões ética, econômica, social, ambiental, cultural e política, e tenham como eixo comum uma produção preocupada com os limites dos recursos naturais, sua necessária preservação e a subsistência das futuras gerações. O desenvolvimento rural sustentável deve ser colocado em prática numa escala local e regional, pois nessas instâncias há a possibilidade de se contrapor às imposições e influências do grande capital, com seu modelo agropecuário perverso, excludente e predatório.
Portanto, é um modelo que vai contra os mecanismos usuais de mercado, que ignoram facetas como a ética, o social e o ambiental e privilegiam a produção pautada pelo lucro e não pela preservação socioambiental e manutenção da vida e das famílias no campo, a exemplo da pecuária extensiva, geradora de êxodo rural e concentração de renda e fundiária.  Diante disso, é necessário estabelecer formas de controle social, interligadas entre si, para garantir que essas bases locais de desenvolvimento sustentável mantenham sua autonomia e progresso.
            Os debates em torno da Questão Ecológica, que ganharam força da segunda metade do século XX em diante, explicitaram os danos causados pela produção desenfreada e desregulamentada. Desde então, fortaleceu-se uma visão critica em torno da ideia de que o crescimento econômico é condição suficiente e determina o progresso humano.
            Muitos foram os caminhos alternativos desenhados, que têm em comum a busca por um processo de desenvolvimento fundamentado em um crescimento econômico qualitativamente distinto. Aos bens econômicos devem estar integrados os bens ecológicos e socioculturais, mantendo-se ou potencializando-se todos, conjuntamente, e não um em detrimento do outro. Eis os fundamentos da ideia de “desenvolvimento sustentável”, que deve aliar crescimento econômico, justiça social e preservação ambiental. Tais fatores são entendidos como interdependentes.
É importante considerar a integração entre crescimento econômico e justiça social para se atingir um desenvolvimento sustentável compatível com um padrão de sociedade diversa e globalizada onde a facilidade de acesso aos produtos deva estar acompanhada da possibilidade de chegar às mãos de um número maior de pessoas, produzindo uma inclusão social que representa a redução das desigualdades.
Mas é de suma importância fazer uma diferenciação e classificação dos discursos referentes à sustentabilidade. Não estamos falando de “ecotecnocracia”, ou seja, das tentativas de solucionar os “entraves ambientais” colocados ao crescimento econômico, como no discurso atual que o meio ambiente é a “praga brasileira”. Estamos defendendo uma perspectiva holística ecossocial, ou o “ecodesenvolvimento”, que busca mudanças estruturais na sociedade, fundando um novo pacto de solidariedade social, pautado por uma perspectiva includente, justa e sustentável.
            Afinal, a natureza, os recursos hídricos, o ar puro, a vegetação e o solo não estarão sempre à nossa disposição, se não preservarmos. Um meio ambiente saudável é um direito humano e não mercadoria. Portanto, bens naturais não devem ter preço, mas o acesso a eles ser garantido a todas e todos, já vivos e que virão à vida.
            Pensar o desenvolvimento rural nessa perspectiva, como já aplicada em muitas Escola Família Agrícola espalhadas pelo Médio Mearim, é pensar o espaço territorial local ou regional, onde há interação de diversos setores produtivos, que devem se harmonizar e desenvolver conjuntamente. As áreas rurais também desempenham diferentes funções, garantidoras do processo geral de desenvolvimento sustentável. Se, anteriormente, a produção era voltada apenas para agricultura, agora pode abranger várias atividades, como artesanato, processamento da produção, turismo rural e a conservação ambiental. Ou seja, o desenvolvimento rural assume não somente aspecto multissetorial, mas também multifuncional, garantindo a permanência da população no campo.
Em resumo, o conceito de desenvolvimento rural almejado, que temos como princípio, está diretamente ligado aos princípios agroecológicos, baseados no descobrimento, organização, análise e potencialização dos elementos locais, de maior resistência e produtividade, para através deles desenhar, de forma participativa, estratégias de desenvolvimento definidas a partir da própria identidade do etnoecossistema concreto em que se inserem. Assim, o princípio e a diretriz aqui é de um desenvolvimento rural que parta das especificidades do local, privilegiando a sustentabilidade socioambiental, os saberes, as práticas tradicionais e a cultura das comunidades rurais. Estamos falando da ênfase nas pequenas unidades de produção manejadas pelo trabalho da família com o apoio e incentivo do poder público. Eis o caminho para democratizar o campo, subsidiar as famílias e absorver sua produção na dinâmica também da vida urbana, ofertando incentivos para que o produtor possa diversificar e manter sua unidade produtiva. Enfatizar a produção local é gerar renda no município, o que pode e deve estar integrado com o incentivo para o beneficiamento dessa produção e sua exportação, fortalecendo ainda mais a economia local, a exemplo da empresa já consolidada, Biocana.

            Referências

ASSIS, R. L. de. Desenvolvimento rural sustentável no Brasil: perspectivas a partir da integração de ações públicas e privadas com base na agroecologia. Economia  Aplicada,n.10, 2006.
CAPORAL, F. R. Extensão rural e agroecologia: temas sobre um novo desenvolvimento rural, necessário e possível. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2007.
KAGEYAMA, A. Desenvolvimento rural: conceito e medida. Cadernos de Ciência & Tecnologia, v. 21, n. 3, p. 379-408, 2004.
LUCENA, C. S. de S.; LIMA, F. E. de S.; PEREIRA, C. da S.A agricultura familiar na comunidade quilombola do  Pêga, em Porto Alegre – RN.  Geotemas, Pau dos Ferros, Rio Grande do Norte, Brasil, v.6, n.1, p.51-66, 2016.
NAVARRO, Z. Desenvolvimento rural no Brasil: os limites do passado e os caminhos do futuro. Estudos avançados 15 (43), p. 83-100, 2001.
SOGLIO, F. D. e KUBO, R. R. (Orgs). Desenvolvimento, agricultura e sustentabilidade. Coordenado pela SEAD/UFRGS. – Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2016.

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