O aumento da preocupação com a
questão ambiental levou à realização de várias conferências internacionais para
discutir a relação entre meio ambiente e desenvolvimento. Nessas reuniões foram
produzidos vários documentos, como a Carta da Terra, com propostas voltadas ao planejamento
e implementação de estratégias de desenvolvimento. Porém, não se trata de
desenvolvimento a qualquer custo, mas de alternativas socialmente justas e ambientalmente viáveis. Eis o “desenvolvimento sustentável”.
Diante de tamanha crise
ambiental, é fundamental nos atermos, efetivamente, a esse paradigma. O
desenvolvimento sustentável precisa ser traduzido em políticas públicas que
articulem as dimensões ética, econômica, social, ambiental, cultural e
política, e tenham como eixo comum uma produção preocupada com os limites dos
recursos naturais, sua necessária preservação e a subsistência das futuras
gerações. O desenvolvimento rural
sustentável deve ser colocado em prática numa escala local e regional, pois
nessas instâncias há a possibilidade de se contrapor às imposições e influências
do grande capital, com seu modelo agropecuário perverso, excludente e predatório.
Portanto, é um modelo
que vai contra os mecanismos usuais de mercado, que ignoram facetas como a
ética, o social e o ambiental e privilegiam a produção pautada pelo lucro e não
pela preservação socioambiental e manutenção da vida e das famílias no campo, a
exemplo da pecuária extensiva, geradora de êxodo rural e concentração de renda
e fundiária. Diante disso, é necessário estabelecer formas de controle social,
interligadas entre si, para garantir que essas bases locais de desenvolvimento
sustentável mantenham sua autonomia e progresso.
Os
debates em torno da Questão Ecológica, que ganharam força da segunda metade do
século XX em diante, explicitaram os danos causados pela produção desenfreada e
desregulamentada. Desde então, fortaleceu-se uma visão critica em torno da
ideia de que o crescimento econômico é condição suficiente e determina o progresso
humano.
Muitos
foram os caminhos alternativos desenhados, que têm em comum a busca por um
processo de desenvolvimento fundamentado em um crescimento
econômico qualitativamente distinto. Aos bens econômicos devem estar integrados
os bens ecológicos e socioculturais, mantendo-se ou potencializando-se todos,
conjuntamente, e não um em detrimento do outro. Eis os fundamentos da ideia de
“desenvolvimento sustentável”, que deve aliar crescimento econômico, justiça
social e preservação ambiental. Tais fatores são entendidos como
interdependentes.
É importante considerar a integração entre
crescimento econômico e justiça social para se atingir um desenvolvimento sustentável
compatível com um padrão de sociedade diversa e globalizada onde a facilidade
de acesso aos produtos deva estar acompanhada da possibilidade de chegar às
mãos de um número maior de pessoas, produzindo uma inclusão social que representa
a redução das desigualdades.
Mas é de suma importância fazer uma diferenciação e
classificação dos discursos referentes à sustentabilidade. Não estamos falando
de “ecotecnocracia”, ou seja, das tentativas de solucionar os “entraves
ambientais” colocados ao crescimento econômico, como no discurso atual que o
meio ambiente é a “praga brasileira”. Estamos defendendo uma perspectiva
holística ecossocial, ou o “ecodesenvolvimento”, que busca mudanças
estruturais na sociedade, fundando um novo pacto de solidariedade social,
pautado por uma perspectiva includente, justa e sustentável.
Afinal, a natureza, os recursos hídricos, o ar puro, a vegetação e o solo
não estarão sempre à nossa disposição, se não preservarmos. Um meio ambiente
saudável é um direito humano e não mercadoria. Portanto, bens naturais não
devem ter preço, mas o acesso a eles ser garantido a todas e todos, já vivos e
que virão à vida.
Pensar o desenvolvimento rural nessa
perspectiva, como já aplicada em muitas Escola Família Agrícola espalhadas pelo
Médio Mearim, é pensar o espaço territorial local ou regional, onde há interação
de diversos setores produtivos, que devem se harmonizar e desenvolver
conjuntamente. As áreas rurais também desempenham diferentes funções, garantidoras
do processo geral de desenvolvimento sustentável. Se, anteriormente, a produção
era voltada apenas para agricultura, agora pode abranger várias atividades,
como artesanato, processamento da produção, turismo rural e a conservação ambiental. Ou seja, o
desenvolvimento rural assume não somente aspecto multissetorial, mas também
multifuncional, garantindo a permanência da população no campo.
Em resumo, o conceito
de desenvolvimento rural almejado, que temos como princípio, está diretamente
ligado aos princípios agroecológicos, baseados no descobrimento, organização,
análise e potencialização dos elementos locais, de maior resistência e
produtividade, para através deles desenhar, de forma participativa, estratégias de
desenvolvimento definidas a partir da própria identidade do etnoecossistema
concreto em que se inserem. Assim, o princípio e a diretriz aqui é de um
desenvolvimento rural que parta das especificidades do local, privilegiando a
sustentabilidade socioambiental, os saberes, as práticas tradicionais e a
cultura das comunidades rurais. Estamos falando da ênfase nas pequenas unidades
de produção manejadas pelo trabalho da família com o apoio e incentivo do poder
público. Eis o caminho para democratizar o campo, subsidiar as famílias e
absorver sua produção na dinâmica também da vida urbana, ofertando incentivos
para que o produtor possa diversificar e manter sua unidade produtiva.
Enfatizar a produção local é gerar renda no município, o que pode e deve estar
integrado com o incentivo para o beneficiamento dessa produção e sua
exportação, fortalecendo ainda mais a economia local, a exemplo da empresa já
consolidada, Biocana.
Referências
Referências
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no Brasil: perspectivas a partir da integração de ações públicas e privadas com
base na agroecologia.
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LUCENA, C. S. de S.; LIMA, F. E. de S.; PEREIRA, C. da S.A agricultura
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F. D. e KUBO, R. R. (Orgs). Desenvolvimento, agricultura e sustentabilidade.
Coordenado pela SEAD/UFRGS. – Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2016.
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