Você já pensou como seria o isolamento social se não tivéssemos nenhum acesso à internet? Em
tempos de pandemia, sua importância para nossas vidas está evidente. Mesmo
antes disso tudo, muitos países já haviam reconhecido o acesso à internet como um direito fundamental,
por garantir o acesso aos outros e por ter se tornado necessidade econômica,
social, cultural e política em nosso tempo. É o caso da Finlândia, Estônia,
Espanha, Grécia, Costa Rica, dentre outros, com muitos já tendo financiado
projetos em grande escala de difusão de sinal de aberto. No Brasil, a
Lei 12.965/14 (“Marco Civil da Internet”) a reconhece como “essencial ao
exercício da cidadania”, podendo ser associada, por exemplo, à Lei de
Acesso à Informação (12.257/11), que estabeleceu mecanismos obrigatórios de
divulgação e garantia de livre acesso aos cidadãos visando maior transparência
nas gestões e melhor exercício do controle social. Caminhamos para uma
necessária “democracia digital”?
Pensemos
em Bacabal, onde boa parte da população vive conectada, especialmente, em
grupos de Whatsapp. Por meio destes, circulam informações sobre a cidade,
estado e país, ações de diferentes políticos, permitindo um monitoramento de seus
mandatos, bem como ofertas comerciais e possibilidades de cursos, negócios e
trabalho ou, ainda, acesso a bens culturais, como músicas, artes plásticas e
filmes, além do entretenimento e lazer, aproximando as pessoas. Esses exemplos
evidenciam a centralidade da internet na garantia dos direitos econômicos,
sociais e culturais, mas também civis e políticos, aumentando a qualidade de
vida.
Contudo,
nem todos podem pagar pelo acesso. Dados apontam que, em 2014, cerca de quatro
bilhões de pessoas permaneciam sem acesso à internet, especialmente, nos países
subdesenvolvidos, embora 83% das pessoas entrevistadas em uma pesquisa, oriundas
de 24 países, responderam que o acesso à internet é um direito humano básico. No
Brasil, dados de 2018 apontam que, 126,9 milhões de pessoas acessam a internet,
equivalendo a 70% da população. É um avanço notável se considerarmos que, em
2008, eram 34% do total e, em 2013, 51%. Contudo, os números são menores entre a
população da zona rural e as classes sociais E e D (respectivamente, 49 e 48%
do total), o que mostra a desigualdade também no acesso à internet, impactando
ainda mais a vida dos mais pobres, já que cada vez mais a vida em sociedade
depende das ferramentas on-line.
Em
escala mais ampla, a acessibilidade é assunto a ser resolvido em fóruns internacionais e dialogando com quem ainda trata do acesso como mercadoria e não direito social.
Mas, na escala local, já é possível garantir o acesso irrestrito, por meio de um
consórcio do poder municipal com o estadual, ou por meio de uma iniciativa
público-privada, para garantir esse direito básico para a população, destinando a ele parte dos impostos.
Não
é um sonho, mas se antecipar às tendências globais. Tal tema há tempos vem
sendo pautado em encontros internacionais. Inclusive, o Conselho de Direitos
Humanos da ONU tem um relatório (de código A/HRC/32/L.20) sobre a “promoção,
proteção e fruição dos direitos humanos na internet”. Nele reconhece que a
difusão de tecnologias de informação e comunicação e conectividade global
possuem grande potencial de acelerar o progresso humano, desenvolvendo
sociedades de conhecimento e preenchendo lacunas sociais. Ademais, a internet
potencializa o direito à liberdade de expressão, assim como o potencial de
desenvolvimento sustentável e inovação das sociedades. Faz-se necessário,
paralelamente à garantia do acesso, uma “alfabetização digital”, que inclua
também medidas para coibir a circulação de notícias falsas, discursos
discriminatórios e que incitam o ódio e a violência, fortalecendo a cultura da
paz e o diálogo respeitoso. Nas palavras do relator apontado pelo órgão da ONU
para avaliar o tema, Frank La Rue:
Diferentemente
de qualquer outro meio, a internet permite aos indivíduos procurarem, receberem
e partilharem informações e ideias de todos os tipos, instantaneamente e de
forma gratuita através das fronteiras nacionais. Ao expandir enormemente a
capacidade dos indivíduos gozarem de seu direito à liberdade de opinião e
expressão, que é um garantidor dos demais direitos humanos, a internet
potencializa o desenvolvimento econômico, social e político e contribui para o
progresso da humanidade como um todo. Dado que a internet se tornou uma
ferramenta indispensável para efetivar uma ampla gama de direitos humanos,
combater as desigualdades e acelerar o desenvolvimento e progresso humano,
garantir o acesso universal deve ser uma prioridade de todos os Estados.
A
opinião de La Rue é partilhada por diferentes especialistas, que enfatizam como
“as tecnologias têm transformado indivíduos em uma importante fonte de
informação, engajamento sociopolítico e controle do poder público, permitindo
um maior empoderamento dos cidadãos para desencadearem processos de
transformação social.”. Portanto, é necessário viabilizar o acesso,
instrumentalizar as pessoas e valorizar a internet e redes sociais como “espaço
democrático fundamental”, além de espaço de negócios e desenvolvimento pessoal,
econômico, social, político e cultural. Deve ser tema escolar e comunitário, com todos e todas tendo aceso livre à internet.
Referências
LAVADO,
Thiago. Uso da internet no Brasil cresce, e 70% da população está conectada.
G1, 28 set. 2019. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/tecnologia/noticia/2019/08/28/uso-da-internet-no-brasil-cresce-e-70percent-da-populacao-esta-conectada.ghtml.
MAGRANI,
Eduardo. Democracia conectada: a internet como ferramenta de engajamento
político-democrático. Curitiba: Editora Juruá, 2014.
UNITED
NATIONS. General Assembly. Promotion and protection of all human rights, civil,
political, economic, social and cultural rights, including the right to
development. 2016.